segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

TAC da Ilha Grande: 12 anos de um crime continuado

O dia 20 de janeiro de 2002 marca o início de um sonho desfeito pela incúria governamental: em pleno feriado de São Sebastião, foi assinado o famoso TAC da Ilha Grande. Sua duração prevista foi de um ano. A presença festiva, na Vila do Abraão, do então Ministro do Meio Ambiente, do Ministério Público e dos altos escalões das três instâncias de governo anunciava as tão esperadas soluções, no atacado, para os sérios e urgentes problemas da sétima maravilha do estado e da trigésima ilha mais  bem conservada do mundo. Em um ano, segundo o instrumento de execução extrajudicial assinado, a Ilha Grande estaria com canteiros de obra espalhados em seu território para amenizar alguns sofrimentos nossos de cada dia. Um verdadeiro plano de governo: saneamento ambiental (esgoto e lixo) de toda a Ilha Grande, recuperação de áreas degradadas, estudos de capacidade de carga, ordenação da ocupação dos imóveis do estado em mãos indevidas e finalmente, mas não por último, a tão desejada quanto até agora esquecida consolidação de procedimentos e normas para a realização de obras e construções, cujo principal escopo obrigava seus signatários a resolver problemas relacionados ao uso do solo, ou seja:  ocupações inadequadas e irregulares, invasões, ocupação urbana de áreas frágeis, privatização de praias e trilhas, conflito de atividades em terra e no espelho d´água.
Difícil dizer que, cumprido pelo menos esta última obrigação do TAC da Ilha Grande, parte das conhecidas tragédias de ano novo não teria acontecido. O corajoso Ministério Público infelizmente não chegou a tempo, apesar das inúmeras representações a ele encaminhadas pela cidadania organizada solicitando a devida execução. O TAC da Ilha Grande chegou a inspirar textos acadêmicos, palestras e trabalhos de fim de curso.
Hoje, 4.383 depois, o balanço do TAC da Ilha Grande é de chorar. Nada vezes nada foi cumprido. Exemplo de um crime continuado, ninguém ainda foi preso; sequer processado. Algumas tentativas para implantar sistemas de tratamento de esgoto na Ilha Grande, por exemplo, transformaram-se em chabu na debochada expressão do secretário Minc em reunião pública. E tome recursos indo pelo ralo. Anunciado publicamente com estardalhaço pelo prefeito de Angra e o secretário do Ambiente o jornais souberam da aplicação de R$ 4,8 milhões para o saneamento de quatro praias da Ilha Grande. Alguém viu onde foi parar a dinheirama? Alguém sabe se as multas contratuais no valor de R$ 84 milhões foram cobradas?
Triste e sofrido povo da Ilha Grande, que amarga frustrações históricas, com chance zero de serem atendidas. Pelo menos com essa gente que nos governa.

Com mais de 15.000 visitas ao seu blog, o
Comitê de Defesa da Ilha Grande deseja a seus associados e a todos aqueles que lutam por uma vida melhor um feliz 2014, ilustrando seu desejo com a mensagem do grande cartunista Claudius, publicada no nº 202 da revista Caros Amigos, cuja assinatura pode ser feita em www.carosamigos.com.br ou (11) 3123-6600.

sábado, 21 de setembro de 2013

Plano de Manejo da APA Tamoios: a história contada pelos que se dizem vencedores


Sobre o Processo Administrativo (PA) E-07/301586/2008 que trata da Revisão do Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental de Tamoios.

"Nós sobrevivemos ao pau-de-arara
Mas o pau-de-arara também sobreviveu".
de um torturado  sobrevivente

Após seis longos e tenebrosos invernos, período marcado por uma forte e inexplicável resistência do INEA em atender às legítimas demandas da cidadania organizada que se faz representar no conselho consultivo da APA Tamoios, foi finalmente publicado o tão esperado Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental de Tamoios – APA Tamoios. Para acessar o mapa do novo zoneamento, ver https://dl.dropboxusercontent.com/u/21773738/Zoneamento%20APATamoios_Dec%2044175-13_ANEXO%20II.jpg.
Dessa forma, o governador do estado Sérgio Cabral Filho, no vértice do poder estadual, apresentou ao distinto público, em 26/04/2013, o decreto nº 44.175, assinado na véspera, que “aprova o Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental de Tamoios, estabelece seu zoneamento e dá outras providências.” Como sempre, indiferente à grandeza a que teria direito, se democrático fosse, aferra-se ao modelo da casa-grande, permite-se tudo que bem entender e impõe-se pelo uso de um poder imperial sobre – e contra - a sociedade, esmerando-se no espancamento do cidadão na proporção de cem contra um. E reina absoluto em um estado que prima pelo desrespeito à legalidade constitucional que aumenta exponencialmente no Rio de Janeiro. Aqui, a partir das manifestações de junho deste ano, vive-se um estado de exceção. Tudo a ver.
O Processo Administrativo aberto para registrar os passos da elaboração do Plano de Manejo, mesmo tendo sido aberto, por obrigação legal, driblou a lei e não atendeu os mínimos requisitos para ser considerado um documento histórico, digno de uma república. Omisso, parcial, tendencioso e desorganizado, no rastro dos vencedores, primou por esconder a verdade factual, na tentativa de construir uma história dita oficial. Atento a isso, um grupo formado pelas entidades a seguir nominadas compilou documentos formais produzidos ao longo da elaboração do Plano de Manejo da APA Tamoios e os encaminhou em representação ao INEA para que o Processo Administrativo (PA) nº E-07/301586/2008 os incorporasse, a bem da verdade factual. A representação pode ser acessada na biblioteca do CODIG, neste blog (Doc_solicit_inclusão_Palno_Manejo_PA_E07_301586_08.pdf).
Estas são as entidades: Associação Curupira de Guias e Condutores de Visitantes da Ilha Grande, Instituto Ambiental Costa Verde – IACV, Associação de Moradores da Enseada de Araçatiba, Jornal O Eco, Associação de Pousadas da Enseada do Bananal – APEB, Liga Cultural Afro-brasileira, Associação dos Meios de Hospedagem da Ilha Grande – AMHIG, Organização para Sustentabilidade da Ilha Grande – OSIG, Comitê de Defesa da Ilha Grande – CODIG Sindicato dos Petroleiros no Estado do Rio de Janeiro- Sindipetro-RJ e Grupo Ecológico de Voo da Ilha Grande – GEVIG.
Mas o pior ainda está por vir: mesmo sendo dono do seu tempo, assessorado por uma estrutura técnica de reconhecida competência, instalada na máquina do governo, o governador já informou que o decreto carece de precisão técnica e deverá ser corrigido. Alguns licenciamentos deverão esperar mais um pouco para serem liberados. Coisas da burocracia pública inconsequente. Fossem outros, já estariam todos no olho da rua.
O INEA deveria, o quanto antes, convocar a todos, prefeitura de Angra dos Reis e a população em geral, aí incluído o conselho da APA Tamoios para apresentar o decreto em tela, seguido de explicações didáticas sobre todos os seus detalhes e seus defeitos. Com isso, restaria evidente a pacificação dos entendimentos sobre o novo diploma, assim como o desejado incremento de eficiência dos processos de licenciamento ambiental que dele advirão, estes há muito dormindo nos escaninhos municipais. Essa seria a ocasião para, por exemplo, esclarecer algumas dúvidas pertinentes, dentre muitas delas:
  
1.     A Procuradoria Geral da República entendeu como inconstitucional o decreto nº 41.921, de 19/06/2009 (ADIN 4370), estando agora o assunto em julgamento no Supremo Tribunal Federal pelo fato daquele ter diminuído o grau de proteção aos espaços naturais por simples ato administrativo e não por lei. O INEA poderá demonstrar que isto não aconteceu com o atual decreto, mesmo que de forma pontual? O novo decreto pode agora ser considerado constitucional?
2.     No caso do novo decreto ter flexibilizado pontos do antigo decreto (20.172, de 01/07/1994), que tratamento será dado às eventuais ilegalidades identificadas e cometidas contra este último?
3.     Como o INEA combinará o decreto com a Lei de Diretrizes Territoriais da Ilha Grande (lei municipal nº 2.088, de 23/01/2009  no que tange, por exemplo, aos Art. 6º, 9º e 11º, que versam sobre a construção de atracadouros nas ilhas? O que irá afinal prevalecer?
4.     O que significa “ampliação fisicamente descontínua” indicada no § 2º do Art. 20?
5.     Como o INEA irá lidar com os casos descritos no Art. 10 que trata da regularização das construções realizadas em desacordo com a lei anterior? Que estrutura operacional será disponibilizada pelo INEA para levar adiante essa tarefa? Como agir no caso da impossibilidade de se assinar um Termo de Ajustamento de Conduta? O Conselho Consultivo da APA Tamoios será consultado?
6.     Em que condições haverá a exigência de apresentação de estudos da capacidade de suporte para implantação de projetos ou de equipamentos turísticos? Como o INEA irá regulamentar essa exigência, na medida em que será a própria raposa a tomar conta do galinheiro, ou o próprio empreendedor a contratar o estudo de capacidade de carga?
7.     Algumas das ZIET estão sendo propostas em áreas de antigas ZVS ou ZCVS (Ilhas da Jipóia, do Maia, do Aleijado e da Pimenta, por exemplo), onde a ampliação das construções não era permitido (caso da ZVS) ou era limitado a 50% da área construída (caso da ZCVS). O INEA pode assegurar a não existência de inconstitucionalidade no caso?
8.     O mesmo se aplica a ZIRT no lugar de ZVS (Saco do Tanguá, por exemplo).
9.     Que procedimentos o INEA irá adotar para resolver os casos mais evidentes de irregularidades, um deles o da Ponta da Raposinha, na Ilha Grande e outro na Ilha da Cavala?

domingo, 20 de janeiro de 2013

Os crimes continuados do TAC da Ilha Grande


“-Gerencialmente mal conduzido, 16 meses após sua assinatura, o TAC caminha para o fracasso total. Indiferente aos insistentes apelos que os segmentos da sociedade, ambientalistas e moradores da Ilha Grande têm feito ao longo desse período, alguns agentes públicos tem-se mantido na mais absoluta indiferença e não oferecem nenhuma resposta”.
Relatório encaminhado pelo CODIG em maio de 2003 ao Ministério Público



autora da imagem: Pawla Kuczynskiego                                                                                                                                             
                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                
O desidratado verão que abriu o ano de 2000 foi marcado por intensa movimentação de um grupo de insatisfeitos moradores da Vila Abraão, porta de entrada da paradisíaca Ilha Grande, que logrou obter cinco mil e quinhentas assinaturas de apoio a um manifesto que encaminharam ao então governador Garotinho. A iniciativa nada tinha de inovadora. Tratava-se simplesmente de exigir solução para os conhecidos problemas de saneamento e ordenamento territorial anabolizados pelo abandono a que foi condenada a Ilha Grande pela tão necessária quanta desastrada desativação do seu complexo estadual penitenciário em 1994. Sem nenhum plano para o dia seguinte, o governo do estado sumiu do mapa no dia seguinte à implosão do presídio da Vila Dois Rios, deixando para trás um expressivo passivo socioambiental e um território escancarado à toda sorte de mazelas.
Passado um par de anos, o fechamento de um lixão irregular feito acontecer por pressão da sociedade, iluminou o fim do túnel. Em concorrida cerimônia na Vila Abraão, como que em homenagem ao dia do seu padroeiro São Sebastião, as autoridades públicas envolvidas assumiram um compromisso de resolver, no atacado, em um ano, os problemas da Ilha Grande. A ensolarada manhã do verão de 20/01/2002 foi testemunha da assinatura do Termo de Compromisso de Ajuste de Conduta da Ilha Grande que obrigava os três entes federativos a cumprirem com o seu dever. Assinaram o TAC da Ilha Grande: Ministério do Meio Ambiente, IBAMA, governo do Rio de Janeiro, sua secretaria do meio ambiente e dois de seus órgãos, incorporados posteriormente ao Instituto Estadual do Ambiente (INEA), a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e a prefeitura de Angra dos Reis. Quem os enquadraram foram o Ministério Público Federal e o Estadual, parceiros na defesa da lei.
Hoje, decorridos exatos 132 meses, ou 11 anos do compromisso assumido, o agora caudaloso verão de 2013, inebriado pelo espocar dos fogos da passagem de ano, engrena marcha-à-ré na roda da história e repete, com cruel exatidão, sem dó nem piedade tudo aquilo pelo qual aquele grupo de moradores se insurgiu há treze anos: acúmulo de lixo nas ruas, torneiras vazias, rios conduzindo esgoto, animais na rua, construções irregulares, ausência de diretrizes mínimas para o turismo e a completa escuridão.
Divididas entre os signatários, suas obrigações eram a de criar um comitê para gerenciar o cumprimento das atribuições, elaborar projetos de saneamento das áreas com concentração populacional (10 enseadas), fazer recuperar áreas degradadas pelos depósitos irregulares de lixo e promover a gestão desses resíduos, aí incluído o projeto de uma barcaça para remoção do lixo para o continente, a ser presenteada pela União, remover ou aproveitar os escombros do presídio, ordenar a ocupação dos imóveis do Estado que continuaram ocupados pelos funcionários  do desativado presídio, elaborar um Plano de Gestão Ambiental, promover estudo de capacidade de suporte a visitantes, disciplinar a realização de obras e construções, elaborar projeto de atratores artificiais para promover a melhoria do uso dos recursos pesqueiros e paisagísticos do entorno da Ilha Grande. O governo do estado entrou com R$ 112 mil e o Ministério do Meio Ambiente com R$ 1,5 milhão para a gestão dos resíduos sólidos e a barcaça para sua retirada da ilha.    
Passados onze longos anos, eis o melancólico balanço:
Salvo a honrosa exceção da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), que passa o pires para dar andamento às suas obrigações, longe de serem efetivamente cumpridas, nada vezes nada aconteceu. A inadimplência é completa, cravejada de promessas vãs, desculpas esfarrapadas, factoides e a indefectível erosão do erario.
Na esfera municipal, nada aconteceu, a não ser pequenas intervenções nos sistemas de esgotamento sanitário, muito mais como tapa-buraco na manutenção e pomposas notícias nos jornais locais de que a "verba do saneamento" iria sair em breve. E o lixo? continua a permanecer nas vias ou viajar para o continente em traineiras improvisadas que brindam o mar com sacos pretos. Os R$ 112 mil disponibilizados pelo Estado foram consumidos na aquisição de improdutivas carretas para transporte de lixo. E o projeto da barcaça? Em uma cidade com tradição naval, possuindo um sem números de estaleiros, o que será que impediu o município de desenvolver um projeto de uma barcaça que, como  exigido no TAC, deveria ter o "porte compatível com o Plano de Gestão de  Resíduos Sólidos"?
A mudança de governo estadual em 2007 quase nada ajudou, frustrando sobremaneira os que apostaram na nova administração. Os recursos obtidos junto ao Fundo  Estadual de Conservação Ambiental (FECAM) de R$ 4,8 milhões destinados ao saneamento da Ilha Grande viraram fumaça ou deram chabu, segundo prosaica explicação do próprio secretário do Ambiente Carlos Minc em 4/8/2011. E agora, com os canteiros das obras inexplicavelmente abandonados, com o que restou dos equipamentos e materiais largados no tempo, vem a nova promessa de mais treze milhões de reais, transformada em estribilho oficial de entrevistas.
Onde estão os atratores do Ibama?
Quanto aos estudos de capacidade de carga da Ilha Grande, o atual governo do estado contratou serviços que estão longe de deslanchar, inclusive por paralização do contrato e se fecha em copas ao ser indagado a respeito.
E o Ministério do Meio Ambiente, quando será procurado pelo município para conversar sobre o presente da barcaça e do cheque federal de um milhão e meio de reais?
Passaram-se onze anos do desembarque do ministro Sarney Filho na Ilha Grande. À exceção da paciente população, mudaram ministros, governadores, prefeitos, secretários. Mas o cenário de descaso permaneceu o mesmo.
Graças ao esmero das autoridades pela omissão, chegamos ao décimo primeiro aniversário do TAC da Ilha Grande e poucos ainda se lembram de sua existência. E muito menos da sua cláusula sexta que dispõe sobre o descumprimento de obrigações pelas partes signatárias que obriga ao pagamento de multa.
Somados os 4.018 dias passados desde a festiva assinatura do TAC da Ilha Grande, na Vila do Abraão, como fazer para executar exatos R$ 76,49 milhões de reais por descumprimento de título executivo extrajudicial, do qual a sociedade civil sempre esteve ausente? Como apurar eventuais atos de improbidade e transformar um acordo extrajudicial descumprido em processo judicial, com a responsabilização dos agentes públicos? O crime continuado do descumprimento das obrigações assumidas, vitais para a preservação de um ambiente saudável, vem inflingindo substanciais prejuízos para a Ilha Grande, para o seu socioambiente e para seus visitantes e moradores, tendo aumentado sobremaneira o grau de degradação que nela se observa. Mais uma aula de como assassinar um destino turístico.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Cenários para 2013


Doze anos de luta desigual

O ente burocrático é indestrutível
Kafka, o Alexandre (representante brasileiro no Fundo Monetário Internacional por 30 anos)


Com doze anos de vida, o CODIG nunca teve vida fácil. Em nenhum sentido. Entrando em campo tendo de enfrentar a família Garotinho, conseguiu fazer apitar uma falta na entrada da área, assinalada pelo inédito TAC da Ilha Grande, que se transformou em símbolo de inadimplência (as multas, se aplicadas, chegam a R$ 76 milhões), galhofa e truculência. Sempre ensaiado, nunca desferido, o chute que poderia se transformar em golaço da cidadania, virou um entediante e impune tocar de bola para os lados. Exemplos? a bagunça no atual recolhimento do lixo na Ilha Grande e o imoral chabu nas suas obras de esgotamento sanitário. Com a entrada em campo da turma do governador Sérgio Cabral, a esperança de virada do jogo foi pro vinagre, atropelada por jogadas não combinadas com a torcida, uma delas a de entregar o verde de nossos parques aos cartolas endinheirados. Desde então, o CODIG transformou-se em uma das poucas vozes no contexto socioambiental sul fluminense a questionar os males do modelo neoliberal de exploração privada dos espaços naturais públicos. A essa altura do campeonato, a bola está com os que se arrogam o direito de conduzir o processo político sobre o qual despejaram rios de dinheiro. Em um mar de anomia, com a sociedade punida por uma lamentável falta de liderança nas decisões estratégicas e um cenário preocupante, o CODIG espera que seu trabalho possa gerar frutos e que mais gente possa debater o assunto.    

Não existe lanche grátis


Ao fim do primeiro mês de seu primeiro mandato, no rescaldo da vitória eleitoral e surfando em algumas ações que mereceram sinceros aplausos da torcida, uma delas a ampliação do monumental Parque Estadual da Ilha Grande, o governador Sérgio Cabral et caterva não perderam tempo: entraram na avenida entoando o samba-enredo da Parceria Público-Privada com a nata empresarial fluminense, leia-se Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro, a poderosa Firjan. Na esteira de uma vaquinha R$ 27 milhões recolhida entre 4 mil patrões (R$ 6.750,00/cabeça), a fundo perdido, o governo do estado recebeu substancial empurrão para destravar a torneira de 17 mil licenças ambientais no Rio de Janeiro, dentre elas a CSA, em Itaguaí, a CSN, em Volta Redonda, a Gerdau, em Santa Cruz e o Complexo Petroquímico em Itaboraí.
No mesmo embalo e no mesmo dia, o jornal O Globo inicia matéria com a seguinte pérola: “O sucateamento do principal órgão responsável pelo licenciamento ambiental no estado chegou a tal ponto que os empresários preferem pagar para serem fiscalizados”. Galhofa pura!
Depois dessa, alguém pode sinceramente acreditar que nossos homens públicos guardarão isenção acomodados no confortável lado em que escolheram ficar? E que, em ambiente onde firmeza ideológica é mercadoria rara, irão manter–se prontos para apoiar os que se sentem no direito de  propor ação popular para anular ato lesivo ao meio ambiente, ao patrimônio histórico e cultural, nos três níveis de governo, como reza o inciso LXXIII do art. 5º da Carta Magna?
Definitivamente, os defensores da natureza estão em extinção. Os seus meios diminuem face ao aumento dos que querem dela, da natureza, tirar proveito a qualquer custo.

O cumpra-se foi pro brejo

O governo do estado e sua área ambiental estão livres e soltos para darem curso aos seus projetos privatizantes. A iminente entrega da APA Tamoios à especulação imobiliária, a desaceleração da implementação do Plano de Manejo do Parque Estadual da Ilha Grande enquanto se desenrola consultoria para modelagem das Parcerias Público-Privadas dos parques estaduais, a alocação de recursos públicos em infraestrutura (o famoso kit sede) nas unidades de conservação, lição aprendida com as demais áreas públicas (transporte, estádios, saúde, estradas), o esvaziamento dos conselhos e a desqualificação dos críticos são o prenúncio do que virá em 2013. Aproveitando-se da posição de maioria para tomar bens e direitos da minoria, nada mais fazem do que um verdadeiro arrastão. Independente de como tem sido feito - na política, na rua ou no estádio – em ambiente consultivo ou não, o ato não confere moralidade nem legitimidade.
O governo do estado demonstra querer transformar seu setor de áreas naturais protegidas em agência reguladora. Carente de massa crítica gerencial em implantação e operação dos complexos parques estaduais, sem um consistente programa de capacitação de seu corpo técnico-gerencial e sofrendo ainda os efeitos da fusão das três agendas ambientais que nunca se falaram, ficará sem saber o que e como regular, a mercê do conhecimento alheio. A absorção de conhecimento ou de tecnologia é tão ou mais difícil do que a sua geração. E o órgão ambiental estadual infelizmente não tem essa experiência consolidada e nem sistematizada, apesar de possuir um corpo técnico pleno de qualidades individuais, o que está longe do ideal. Por esse caminho, a área ambiental do Rio de Janeiro vai cair na tradicional armadilha, a de ganhar uma coleção de caixas-pretas e um monte de botões para apertar.
O ano de 2013 será marcado pela resistência da sociedade a um modelo que tem tudo para aumentar as diferenças sociais e a concentração de renda. Fernando de Noronha e Iguaçu estão aí para comprovarem que concessão... é um bom negócio.
Entraremos em 2013 com esperança, mas também incertezas. A chegada ao poder municipal de Conceição Rabha - a quem apoiamos e apoiaremos - apresenta um novo cenário, que esperamos promissor, mas que irá exigir muita atenção. Recém incorporada a um conjunto de forças aliadas e alinhadas, agora nos três níveis de governo, tendo que administrar um sem número de acordos políticos, é razoável temer que a prefeita ceda ao desequilíbrio na interlocução com a sociedade. Afinal, o poder tem que estar sempre no limiar da estabilidade. Poder estável é poder absoluto e poder absoluto é ditadura. Para assegurar o esperado brilhantismo de sua administração, a nossa prefeita vai precisar da colaboração de todas as forças progressistas.
Dela esperamos uma faxina no entulho produzido pela reacionária oligarquia angrense em doze anos de desmandos. Deverá a prefeita estar atenta e ter o necessário pulso para resistir à pressão para transigir. Com carência de quadros técnicos, verificado em algumas escolhas do secretariado municipal, nossa prefeita não pode se render ao fisiologismo, às ordens de cima e ao lobby dos supostos amigos e parceiros de última hora. A prefeita sabe que a derivada da incompetência é a corrupção.
Com uma astronômica receita de quase R$ 1 bi, a prefeita da cidade campeã das exportações brasileiras (US$ 10,663 bilhões e um superávit de US$ 6,928 bilhões) deve priorizar a qualificação de seus quadros e ganhar eficiência em áreas de maior avanço e significado econômico. E, sobretudo, planejar, planejar e planejar, cercando-se de gente competente, séria e honesta.
A prefeita deverá buscar assessoria em tudo que se referir ao petróleo e a sua importância para Angra dos Reis. Deverá obrigatoriamente considerar o significado geopolítico da posse do petróleo, que propiciou o desenvolvimento e ainda sustenta as economias dos países industrializados, que não o tem ou o mantêm guardado como reserva (China, USA), e o seu poder de influência no contexto mundial. Essa riqueza física não pode ser desprezada e muito menos desconhecida.
Deverá também saber da diferença abissal entre os cinco por cento que podem chegar a quinze por cento dos royalties oriundos das receitas do petróleo, pelo qual todos brigam e o restante da riqueza, entregue nos leilões de cartas marcadas e que sairão do país em direção a outras plagas. O que deve ser debatido, a nosso juízo é o que fazer com o resto, com os outros 85%. Como nos ensina o professor Ildo Sauer, de forma simplificada: “se o petróleo vale US$ 100 o barril e se gasta US$ 10 para produzi-lo, tirando os US$ 15 dos royalties ainda sobram US$ 75. O que vamos fazer com esses US$ 75 de cada um dos 100 bilhões de barris que podemos ter? Em vez de tratar dessa questão crucial, estamos preocupados com 5% do Rio de Janeiro. Isso me deixa perplexo”.
Vamos torcer para que a prefeita leve a melhor nas discussões sobre a ampliação do terminal petrolífero de Angra, o TEBIG.
Quanto ao turismo, responsável por alçar a cidade a um dos píncaros dos melhores destinos turísticos nacionais e internacionais, torcemos para que a prefeita Conceição coloque seu melhor time em campo para corrigir os históricos erros do passado, travestidos de “turismo de grande porte”, modelo responsável direto pelas verdadeiras tragédias sociais da cidade nos últimos quarenta anos. Excludente pela sua própria natureza, o modelo de turismo que se implantou na cidade nunca deu a ela o retorno socioeconômico esperado. Ou era o dos “ricos”, com o litoral privatizado; ou era o dos criminalizados “pobres”, desprestigiado e vitimado pelo preconceito.

A administração de Neirobis Nagae, o primeiro prefeito angrense com olhar socioambiental  deve servir de paradigma

A decisão estratégica municipal deve ser a de ilhas e praias abertas ao público, economia solidária, turismo de base comunitária - agora com enormes avanços tecnológicos - prestigiados pelo governo federal desde o primeiro mandato de Lula e apoiado por competente aparato legal, estudos qualificados de capacidade de carga, ordenamento territorial, capacitação de mão de obra local, inclusive de caiçaras e comunidades tradicionais. Aí reside a verdadeira fonte de riqueza de Angra dos Reis no quesito turismo: um turismo aberto e público.  

O grande custo será não aprendermos com nossos erros, ou, pior ainda, com nossos acertos

Sem esquecer das outras áreas, inclusive e principalmente sociais, entendemos que a formação de um núcleo estratégico deverá ser criado, com o intuito de assessorar a prefeita nas áreas de petróleo e turismo. Temos plena certeza de que o trato competente dessas duas áreas farão do mandato da professora Conceição Rabha uma referência a ser seguida.
Nos primeiros dias de 2013 nossos corações, mentes e olhos estarão voltados para os movimentos da prefeita na direção do diálogo e no fortalecimento da interlocução social.
Torcemos para que a nova administração municipal seja bem sucedida na tarefa de dar cabo aos desmandos e aos desgovernos passados, com a necessária elevação dos níveis de debate político.    O CODIG, por sua vez, continuará cumprindo com seu dever. Presente sempre que possível nos espaços de debates, o CODIG continuará a fortalecer sua atuação cidadã nos conselhos do Parque Estadual da Ilha Grande, da Área de Proteção Ambiental de Tamoios, no Comitê de Bacia Hidrográfica da Baía da Ilha Grande, do qual foi um dos fundadores e que hoje faz parte da sua Diretoria Colegiada e na Coordenação do Mosaico Bocaina, mais um espaço plural de atuação.
E, por fim, mas não finalmente, sempre crítico, buscando o judiciário para fazer valer a lei. 
Que o ano de 2013 seja pleno de igualdade e justiça social.